Migração devido ao clima já é mapeada nos EUA

Os fluxos migratórios influenciam profundamente a sociedade e a economia, e os EUA já começaram a mapear em que ponto as pessoas desistem de insistir numa região frequentemente atingida.

Um cachorro passa por uma pilha de itens destruídos que foram removidos de uma casa inundada, enquanto os moradores iniciam o processo de recuperação do furacão Harvey em 31 de agosto de 2017 em Houston, no Texas.

Cidades e regiões já começaram a ser abandonadas devido ao aumento da frequência de desastres climáticos, é o que apontam os estudos sobre a realidade imobiliária dos EUA – que não é idêntica à nossa, mas tem pontos fundamentais em comum.

No caso dos vizinhos do norte, a maior parte dessas regiões fica nas regiões costeiras, em especial na Florida, Texas e na parte central da Costa Leste - onde se concentram os efeitos das tempestades que acompanham a temporada de furacões no Atlântico Norte.

“Área de abandono climático” é uma região onde o risco de inundações cresceu o suficiente para começar a forçar as pessoas a partirem.

Mas o mesmo padrão se repete em outras regiões com situações mais próximas às que observamos também no Brasil: lugares onde chuvas intensas, ciclones tropicais e inundações costeiras e fluviais estão se tornando problemas maiores e mais frequentes.

“As pessoas percebem quais as partes da sua região que devem ser evitadas e quais são mais seguras, e agem de acordo com isso”, afirma Jeremy Porter, demógrafo e líder da investigação sobre implicações climáticas realizada pela First Street Foundation. “Observando os mercados imobiliários, notamos que as pessoas vem sendo muito mais atentas na escolha sobre onde viver.”

A First Street Foundation é um grupo de pesquisa sem fins lucrativos que recentemente desenvolveu ferramentas – das quais precisamos logo ter similares por aqui! – para ajudar os residentes a avaliar os riscos de inundações, incêndios e condições climáticas extremas que as propriedades individuais enfrentam, conforme publicação desta semana na Nature, com participação de pesquisadores de diversas universidades e do Fundo de Defesa Ambiental, também sem fins lucrativos.

As migrações também incluem as mudanças dentro de uma mesma área urbana, abandonando a região mais afetada.

O estudo faz uma importante distinção: quando as pessoas pensam nas migrações causadas pelas mudanças climáticas, imaginam alguém se mudando para longe de casa e para outra parte do país. Mas isso é apenas uma pequena fatia das tendências globais de migração, e a maioria das pessoas se muda dentro da mesma cidade ou área metropolitana, ressalta Porter.

A partir daí, o estudo cruzou dados de risco de inundação com as informações do censo, para mapear a relação entre inundações e mudanças populacionais, controlando outros fatores – como a disponibilidade de emprego – que também podem afetar a decisão de alguém quanto a se mudar.

Foi assim que a pesquisa encontrou pontos de inflexão para cada região: um limite em que as inundações se tornam tão graves que as pessoas começam a deixar a área. Esse ponto de inflexão varia de lugar para lugar, e mostra que as pessoas começaram a se afastar quando cerca de 5% a 15% das propriedades em uma área são colocadas em risco de inundação.

Curiosamente, o mesmo estudo aponta também um fenômeno contrário (e minoritário): regiões que estão em crescimento populacional apesar do seu risco ampliado de inundações.

Veremos o que acontecerá com essas. "A exposição da população nos próximos 30 anos é uma preocupação séria", disse Evelyn Shu, analista sênior de pesquisa da First Street Foundation e principal autora do artigo. "Por décadas, optamos por construir e desenvolver em áreas que acreditávamos não ter risco significativo, mas devido aos impactos das mudanças climáticas, essas áreas estão começando a se parecer muito rapidamente com áreas que evitamos no passado."